Estratégias de Entrada no Brasil: Os prós e contras de se estabelecer uma subsidiária brasileira
- Valesca Camargos

- 16 de nov. de 2023
- 8 min de leitura
Atualizado: 23 de out. de 2024

1. Introdução
Entrar no mundo dos negócios internacionais envolve trilhar caminhos intrincados, com cada decisão ecoando suas repercussões em termos de custos, implicações legais e estratégias de mercado. Dentro desse panorama global, o Brasil se destaca como um farol de vastas oportunidades, convidando os investidores a explorar seu rico terreno econômico. No entanto, antes de se aprofundar, uma pergunta pertinente paira na mente de muitas empresas estrangeiras: é mais estratégico operar diretamente da base doméstica, vendendo como um fornecedor estrangeiro, ou estabelecer uma presença mais enraizada abrindo uma subsidiária local no Brasil?
Embora reconheçamos plenamente que as especificidades de cada caso desempenham um papel fundamental e que as peculiaridades do cliente podem influenciar muito a decisão, esta análise tem como objetivo esclarecer certos fatores determinantes. Neste artigo, exploraremos as diferentes variáveis que podem influenciar a decisão de um investidor entre operações diretas a partir de sua sede ou a instalação de uma unidade local no Brasil. Quer você seja um investidor experiente ou um novato na área de comércio internacional, compreender essas nuances é essencial para elaborar uma estratégia bem-informada e adaptada ao exclusivo mercado brasileiro.
2. Decifrando as formas de intermediação de vendas no Brasil: Distribuição, representação comercial e corretagem.
Nas transações comerciais internacionais, é fundamental entender os caminhos da intermediação de vendas. O Brasil oferece um conjunto de modelos de intermediação para fornecedores estrangeiros. Aqui, elucidaremos as principais características e diferenças entre os contratos de Distribuição, Representação Comercial e Corretagem.
2.1 Contrato de distribuição
A característica distintiva do contrato de distribuição é que o intermediário/distribuidor assume a função de importar a mercadoria, assumindo assim os riscos associados e depois a revende no mercado nacional.
Esse modelo pode ser ideal para empresas que preferem uma abordagem mais prática, contando com um distribuidor experiente que entende a logística do mercado local, o comportamento do consumidor e o ambiente regulatório.
Deve-se considerar, no entanto, que como o distribuidor importa e depois revende, as camadas da cadeia de suprimentos podem ser aumentadas, o que pode levar a um preço mais alto para o consumidor final.
2.2 Contrato de Representação Comercial
Aqui, o vendedor estrangeiro lida diretamente com o cliente final, que assume a responsabilidade de importar a mercadoria. O representante comercial simplesmente conecta o vendedor estrangeiro ao comprador nacional.
Esse tipo de contrato é regido por uma lei específica no Brasil - a Lei nº 4.886/65. Isso confere ao representante direitos e garantias adicionais, possivelmente incorrendo em custos adicionais para o vendedor estrangeiro. É imperativo que as entidades estrangeiras compreendam os meandros dessa lei para contornar obrigações imprevistas.
Esse modelo pode ser o mais adequado para empresas que desejam manter um relacionamento direto com seus clientes, possivelmente para transações de alto valor ou produtos especializados em que o relacionamento direto pode ser uma vantagem adicional.
2.3 Contrato de Corretagem
Embora o corretor, assim como o representante comercial, vincule o fornecedor estrangeiro ao comprador local, sua principal característica é sua natureza transitória. Os contratos de corretagem são normalmente mais flexíveis, atendendo a negócios específicos de curto prazo, em vez de relacionamentos comerciais de longa duração. E, diferentemente do representante comercial, eles não estão vinculados a uma legislação específica, oferecendo ao fornecedor e ao corretor uma estrutura operacional mais livre.
Esse formato é ideal para transações ocasionais ou negócios específicos em que a continuidade não é o foco principal. Dada a ausência de um contato brasileiro estruturado e regular, ambas as partes devem ter um bom domínio dos processos de importação, pois o ônus da importação recai sobre o cliente final.
Escolhendo a melhor abordagem
Os acordos de exclusividade podem ter uma profunda influência na escolha da intermediação. Em um Contrato de Distribuição, os distribuidores geralmente solicitam e recebem direitos exclusivos de venda em um território ou segmento de mercado específico no Brasil.
Essa exclusividade é uma faca de dois gumes. Por um lado, ela pode motivar o distribuidor a investir mais recursos, garantindo o sucesso do produto no mercado, pois ele tem a garantia de que nenhum outro distribuidor concorrerá diretamente com ele na área designada.
Por outro lado, ela vincula o vendedor estrangeiro a esse distribuidor, limitando potencialmente o alcance do mercado se o distribuidor tiver um desempenho inferior ou se a dinâmica do mercado mudar. Portanto, se a exclusividade for a principal preocupação, as empresas precisam pesar suas vantagens em relação às possíveis limitações.
Para empresas que têm como alvo clientes que são proficientes em processos e legalidades de importação, o modelo de representação comercial ou corretagem pode ser mais adequado. A natureza do relacionamento - se é de longo prazo e aprofundado ou mais transacional - ditará a escolha entre esses dois modelos.
Em suma, o cenário de intermediários no Brasil está repleto de opções, cada uma oferecendo suas vantagens e desafios distintos. O sucesso nesse mercado depende do alinhamento das necessidades comerciais com o modelo apropriado, levando em conta também o tipo de produto, a demografia do cliente, a profundidade desejada do relacionamento e, principalmente, as considerações sobre exclusividade e flexibilidade.
3 Aspectos práticos da importação de produtos no Brasil.
Para as empresas estrangeiras que optam por não estabelecer uma subsidiária local no Brasil e dependem de modelos de intermediação, é fundamental compreender os princípios básicos da importação de produtos no Brasil. Embora as nuances da importação variem com base em acordos bilaterais entre o Brasil e outros países, alguns princípios fundamentais permanecem consistentes.
Documentação: Como a maioria dos países, o Brasil exige um conjunto de documentos importantes para as importações. Isso normalmente inclui uma fatura comercial, conhecimento de embarque ou conhecimento aéreo, Romaneio de Carga e um certificado de origem. O Certificado de Origem, em particular, é fundamental porque confirma onde o produto foi fabricado e pode influenciar as classificações tarifárias, dependendo dos acordos comerciais bilaterais.
Classificação alfandegária: O Brasil utiliza o sistema de Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), baseado no Sistema Harmonizado internacional. Essa classificação determinará os impostos de importação a serem aplicados.
Acordos bilaterais: O Brasil tem vários acordos comerciais com determinados países que podem agilizar o processo de importação. Esses acordos geralmente oferecem taxas alfandegárias preferenciais, tornando os produtos desses países mais competitivos. Entretanto, os benefícios exatos dependem das especificidades do acordo bilateral, e as empresas devem verificar se tais vantagens se aplicam a seus produtos.
Impostos e taxas de importação: A importação para o Brasil vem acompanhada de várias camadas de impostos e taxas. Os mais comuns são o Imposto de Importação (II), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o PIS/COFINS. As taxas e tributos incidentes podem variar de acordo com o produto e sua classificação NCM.
Declaração de importação: Antes que as mercadorias possam ser liberadas pela alfândega, uma Declaração de Importação (DI) deve ser registrada no Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX). Esse sistema centraliza e automatiza os vários procedimentos federais relacionados às operações de comércio exterior.
Licença de importação: Nem todos os produtos exigem uma Licença de Importação, mas para aqueles que exigem, é essencial obter essa licença antes de enviar as mercadorias. A lista de produtos que precisam dessa licença é especificada pelo governo brasileiro e, geralmente, refere-se a itens sensíveis ou regulamentados.
Optar por um modelo de intermediação sem presença física no Brasil coloca a responsabilidade da importação em grande parte sobre a contraparte brasileira, seja ela o cliente final ou o distribuidor. Entretanto, um profundo conhecimento do processo de importação, das taxas, dos impostos e das possíveis vantagens dos acordos bilaterais pode ajudar não apenas a garantir operações comerciais tranquilas, mas também a construir um relacionamento confiável e informado com os parceiros locais. Como em todos os aspectos do comércio internacional, a devida diligência e a atualização com as mudanças regulatórias são fundamentais.
4 Principais estratégias e considerações fiscais para a criação de uma subsidiária no Brasil.
Tomar a decisão de abrir uma subsidiária no Brasil é um passo importante para as empresas internacionais que têm como objetivo o envolvimento de longo prazo no mercado.
É fundamental entender que, no Brasil, o desembaraço e a importação direta de produtos é um direito exclusivo das empresas locais, principalmente daquelas que possuem uma licença de importação conhecida como RADAR. As entidades internacionais são impedidas dessa prática, o que as obriga a recorrer a um Importador de Registro (IOR) - despachante aduaneiro autorizado - ou a um distribuidor, caso operem sem uma unidade local.
Ao estabelecer uma subsidiária no Brasil, as empresas internacionais ganham autonomia para gerenciar suas importações e distribuições, mantendo um controle firme sobre sua estratégia de marketing e imagem de marca no país.
Além disso, o estabelecimento de uma subsidiária brasileira abre a possibilidade de participação em programas de apoio a empresas locais oferecidos pelo governo. As tarifas de importação, uma barreira significativa no mercado brasileiro, podem ser atenuadas com a aplicação do preço de transferência (Transfer Pricing) mais favorável, de acordo com as normas vigentes.
4.1 Remessa de produtos da matriz no exterior para a subsidiária no Brasil.
Quando empresas internacionais estabelecem subsidiárias no Brasil, a movimentação de mercadorias entre a matriz no exterior e a entidade brasileira se torna uma questão operacional e financeira crucial, bastante influenciada pelo princípio do Preço de Transferência (Transfer Princing).
Preços de transferência: Esse princípio em transações internacionais, especialmente envolvendo entidades relacionadas, é crucial para garantir uma tributação justa e desencorajar a transferência de lucros. A abordagem brasileira ao Preço de Transferência, diferente das diretrizes da OCDE, engloba vários métodos:
- Método do custo mais lucro
- Método do preço de revenda menos
- Método da mercadoria
- Método da porcentagem fixa sobre o preço de revenda
- Método de porcentagem fixa sobre o preço de exportação
A escolha do método mais adequado exige uma compreensão detalhada de cada um deles, juntamente com uma avaliação da natureza das transações da empresa, garantindo que os preços nas transações entre entidades relacionadas sejam consistentes com os parâmetros do mercado.
Conformidade operacional: A conformidade com os requisitos fiscais e administrativos e a adesão a uma documentação precisa, especialmente as classificações NCM, tornam-se indispensáveis nesse processo.
4.2 Repatriação de lucros da subsidiária brasileira para a matriz no exterior:
A transferência de lucros de uma subsidiária para sua sede no exterior envolve a adesão a uma estrutura processual e o respeito ao cenário regulatório das transações financeiras internacionais.
Dividendos: Embora o Brasil não cobre impostos sobre dividendos enviados a acionistas estrangeiros, é fundamental determinar como esses dividendos são tributados no país destinatário e explorar quaisquer acordos disponíveis para mitigar a dupla tributação.
Relatórios do Banco Central: A comunicação obrigatória de transações financeiras, inclusive remessas de lucros, deve ser feita ao Banco Central do Brasil (BACEN). Isso implica a apresentação de todas as transações no sistema eletrônico do BACEN para garantir a conformidade com as normas cambiais brasileiras.
Juros sobre o Capital Próprio (JCP): Esse mecanismo permite a remuneração dos acionistas com base na posição do patrimônio líquido e proporciona uma dedução fiscal para a empresa, sendo que os JCP estão sujeitos a um imposto retido na fonte (atualmente a uma alíquota de 15%).
O estabelecimento e a operação de uma subsidiária no Brasil para distribuir produtos/serviços exigem o cumprimento meticuloso das normas financeiras, legais e regulatórias, principalmente no que se refere a preços de transferência e repatriação de lucros. A garantia de que as práticas estejam alinhadas com as leis tributárias locais e internacionais, juntamente com a rigorosa adesão a relatórios e conformidade com o BACEN, não apenas protege o posicionamento legal da empresa, mas também aumenta sua eficácia financeira nas esferas operacionais internacionais.
Conclusão
O fato é que, no final, a decisão entre operar como fornecedor estrangeiro ou estabelecer uma subsidiária no Brasil está intrinsecamente ligada à orientação estratégica da empresa, à demografia dos clientes, ao tipo de produto e ao alcance de mercado pretendido. Essa tomada de decisão requer uma abordagem analítica sólida que combine a estratégia da empresa com a dinâmica única do mercado brasileiro.
O mercado brasileiro, com seus desafios e oportunidades específicos, exige uma abordagem sistemática, bem-informada e estrategicamente alinhada por parte das empresas internacionais. Isso garante que a entrada do estrangeiro no mercado brasileiro esteja, não apenas em conformidade com as normas regulatórias, mas também em harmonia com suas metas comerciais.


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